Chile, un país de temblores culturales — Parte 2

Quanta segurança a terra firme nos dá? O quão inseguro você pode se sentir sem estar com os pés fixos no chão?

Avião, terremoto, tremores que não paravam, mal imaginava que seria no meio das montanhas e vulcões enormes que o melhor estava por vir.

Quinto dia — 01/05 — Tan pequeños ante la naturaleza

Não sei se existe lugar na Terra mais fantástico do que esse, mas posso afirmar com toda certeza que este foi o mais bonito em que estive. Sabe quando você se sente pequeno perante toda grandeza da natureza e ao mesmo tempo parte de um todo, como uma gota d’água no meio do oceano? Eu senti isso de maneira tão intensa que não sei descrever. Tem coisas que realmente a gente nunca vai conseguir expressar em palavras, talvez, o objetivo seja apenas sentir, e se deixar sentir.

Acordamos bem cedinho para irmos em direção a Baño Moralez, um local de banhos termais na província de Cajón Del Maipo. Nas paradas, Seu Guillermo nos disse que encontraríamos as melhores empanadas do Chile. Dito e feito! Empanadas bem temperadinhas, com ingredientes deliciosos e assadinhas artesanalmente.

Nossa viagem demorou mais ou menos uma hora, a estrada estava cheia porque, segundo Seu Guillermo, muitas pessoas decidiram visitar locais como aquele no feriado.

No meio do caminho, havia uma cachoeira e uma lanchonete, paramos para fazer algumas fotos. Por lá, as pessoas faziam piquenique e churrasco.

Quanto mais nos aproximávamos, mais a paisagem ia se transformando. Passamos por lugares maravilhosos, onde a vista montanhosa ia se entrelaçando com as árvores e a inúmeras cores das rochas.

Como será que é viver sob um alerta de avalanches? Como será que é viver sabendo que um terremoto pode acontecer a qualquer instante? Como será que é viver sabendo que talvez não exista amanhã?

Às vezes achamos que estamos sempre seguros e vivemos enclausurados às nossas posses como se fôssemos infalíveis. E por mais que se saiba que a vida não é finita e da certeza da morte, confiamos tanto no que transformamos em conquistas materiais que nos esquecemos, muitas vezes, de viver o hoje.

Quantas vezes nos esquecemos que talvez não exista amanhã e ficamos postergando a vida?

Parece que os chilenos sabem bem disso e procuram aproveitar da melhor forma os seus dias. Será que é por isso que Pablo Neruda dizia tanto para viver o dia como se fosse nem o primeiro, e nem o último, mas o único, rs?

Formas de vida e de viver tão únicas

Bem, a empanada TOP apareceu e foi com esta paisagem incrível e avassaladora ao fundo que a escolhi, rs. Já choraram comendo? Pois é, eu chorei de emoção porque me senti tão plena observando aquele horizonte que nem acreditei que estava fazendo algo tão simples, como comer em frente àquilo.

Parece pintura, né? Tirando a mancha de dedão na lente
É muito louco imaginar o tipo de vida que surge num lugar cheio de rochas

O caminho da volta também era maravilhoso. São muitas fotos deste lugar, não dava para não registrar! Sabe o que é ter receio de esquecer o que se viu, viveu e sentiu? Eu sei que em algum momento minha memória não vai recordar tudo — eu já até esqueci o nome de algumas coisas — , mas não queria esquecer toda aquela paisagem maravilhosa à minha frente. Talvez por isso esse monte de fotos e este texto gigante.

Acho que depois de quarenta minutos na estrada, Seu Guillermo nos falou que tinha uma parada interessante por ali, que dava para tirar fotos e também comentou de um túnel. Achamos estranho, mas fomos e ele disse que iria esperar no carro.

As montanhas em frente à saída do túnel eram repletas de cactos

O túnel tinha quase 1 km e estava completamente escuro e fedido (de xixi mesmo). E mesmo assim, várias pessoas também passavam pelo local. Ao voltarmos, Seu Guillermo disse: eu comentei do túnel, mas não falei para vocês entrarem lá, haha.

Não aconselho ninguém a entrar também!

Barrio Bella Vista

O passeio foi bem cansativo, mas era um dos nossos últimos dias. Então, resolvemos nos aventurar pelas ruas de Santiago de novo.

Como era feriado, dia do trabalho, a maioria das casas estava fechada e as ruas vazias. Mais cedo, alguns protestos rolaram pela cidade e, à noite, provavelmente, as pessoas já tinham voltado para suas casas. Achamos o Liguria, que é um rede de restos-bar (restaurante-bar), bem conhecida na cidade e pensamos em conhecer.

Tomamos banho e Seu Guillermo nos deu uma carona para o metrô Vicente Valdés, por ser mais fácil de irmos para a linha 5 e chegarmos à estação Manuel Montt. Este Liguria ficava bem próximo à saída do metrô, no bairro Providência, porém, estava fechado. Fomos de novo aonde já conhecíamos, rs, mas desta vez ao bairro Bella Vista, um tiro no escuro mesmo. Por lá, as ruas também estavam vazias e muitos comércios fechados.

Um dos lugares que passamos mais de duas vezes dentro foi o Pátio Bella Vista, que é um local bonito com vários restaurantes bares. Mas não sei, algo não me atraiu muito.

Pátio Bella Vista

Paramos em um que parecia mais interessante e amigável, com mesas na rua (assim como aquele que fomos na segunda vez na rua Monjitas). Chama-se Kross Bar, é um bar da cervejaria Kross e algumas cervejas são produzidas lá mesmo. A gente ainda não tinha comido frutos do mar, então, era a hora de arriscar.

Ai que câmera ruim
Menu do Kross Bar / Drink da Tiemi com framboesas, limão, cerveja e pisco.
A imagem tá ruim, né? Pedi uma golden e um maibock, ambas deliciosas. Não entendo muito de cerveja, só sei identificar quais os tipos que eu gosto.
Galeria em frente ao Kross Bar

Pedi uma salada de polvo (ensalada de pulpo), que veio com pimentão, abacate e mais algumas especiarias, e acompanhava pão tipo italiano e um molho de mostarda dijon, e uma cerveja artesanal bem gostosa para acompanhar. Acho que fiquei meio mal acostumada, porque nos bares que fomos, todas as cervejas eram encorpadas, artesanais e deliciosas. Ah, e eram bem mais baratas que aqui. Aqui se paga 12 reais num chopp de IPA (que eu nem curto muito) de 300 ml, lá paguei tipo 15 reais nesse copão ai de 700 ml. :D

Minha irmã pediu uma porção de mariscos empanados. Na real, a gente dividiu tudo o que comeu e bebeu. E tudo estava muito delicioso. Para mim, e acho que ela concorda, foi o melhor lugar que comemos. Estava tudo muito bem temperado, os molhos eram maravilhosos, as porções bem servidas e a apresentação agradável. O atendimento também foi legal, não foi melhor em comparação ao bar da Monjitas ou do Galindo, mas no geral o garçom foi atencioso. Lá também tinha opções veganas (assim como a maioria dos lugares que fomos e vimos).

Ficamos lá até 00:30 porque já não tinha mais ninguém na rua e acho que éramos as últimas clientes, mesmo eles dizendo que fecharia às 2h.

Hoje é um dia de luta, não de diversão.

Foi o que Seu Guillermo nos disse quando chegamos e contamos que estava tudo vazio ou fechado. Interessante essa participação da população, de certa forma, com essas datas. Ele nos contou que no dia da pátria, todos devem estender a bandeira do Chile nas portas de suas casas e, que no geral, as pessoas fazem isso com orgulho. Contei o que representava atualmente (principalmente no ano passado) ostentar a bandeira do Brasil por aqui (ou andar de vermelho) e ele ficou surpreso. Fazer o quê, né? ¯ \ _ (ツ) _ / ¯

Último dia — 02/05 — Único día

No último dia deixamos para fazer tudo o que dava e o que ainda não tínhamos feito em Santiago.

Cerro San Cristóbal

De manhã, pegamos o metrô e descemos na estação Baquedano para irmos ao Cerro San Cristóbal dentro do Parque Metropolitano. Porém, neste dia exato o teleférico estava em manutenção, então pegamos um táxi até determinado ponto e andamos por mais de uma hora até subir ao pico.

Passamos por esta ponte linda que dá ao bairro Bella Vista e vimos este fantoche no farol

Antes do pico, paramos em uma galeria de arte que fica lá dentro e estava tendo exposições de dois artistas. E também dava para ver os teleféricos, só ver, rs.

A caminhada foi longa e o dia estava bem nublado. No caminho também tomamos um mote con huesillos que estava bem gostoso e refrescante. Por lá, tinha bastante gente pedalando e correndo.

Aranha gigante no meio do caminho, no canto, aliás.
Igreja medieval
Caminho das 7 cruzes
Virgem Imaculada Concepción

Lá em cima também tem um terraço, bares e lojas.

Na hora de descermos, o passeio ficou mais interessante (e menos cansativo, se bem que é mais fácil descer que subir, né), porque fomos de funicular. Pensei que fosse rápido, tipo montanha russa (o que seria bem legal), mas era bem devagarzinho e bonito.

Depois, precisávamos ir embora para almoçar. Eram 14h e a fome tava forte.

Mercado municipal

Quando chegamos ao Mercado municipal, eram 16h, porque passamos em outros lugares e demoramos bastante. Apesar de todas as reclamações de turistas que vimos na internet antes, achei que fomos super bem atendidos. Pedimos uma loucura de pratos com mariscos e frutos do mar, em um deles ia o tal loco, que realmente é um delícia.

E não, não é barato comer lá. Pensamos em pedir a centolla famosa, mas o preço é bem salgado e eu não estava muito afim também. Às vezes eu tenho umas alergias loucas à camarão, não sei direito porquê e nem sei se é só com camarão, então resolvi pedir outro prato. Queria experimentar o que era o tal do “a lo pobre”, que na real é alguma carne com ovo, batata frita e cebola caramelizada. Pedi um peixe chamado Congrio, bem gostosinho, mas pedi ele na chapa e veio empanado e frito no óleo. Tudo bem, tamo aí pra experimentar mesmo, depois a gente corre atrás da dieta.

Gigante, né? Eu mal consegui comer e acabei deixando um pouco. / A centolla cabulosa

Depois andamos por outro mercado municipal, que nos lembrou bastante uma mistura de Ceasa com Mercado da Lapa, rs.

O outro lado da ponte / Milho preto doideira

Passamos o resto do dia andando por lá e pegamos o metrô para voltar para casa.

Máquinas de iogurte nas estações, achei bem diferente / Não visitamos a Casa e nem o Museu Pablo Neruda, mas entramos num vagão forrado com poesias dele ❤
Hot dog com avocado / conjunto de xícaras que demos para Seu Guillermo

Depois, à noite, compramos algumas coisinhas para petiscar e a Patricia e o Carlos apareceram para se despedirem da gente. Confesso que não imaginava viver tanta coisa em tão poucos dias e que iria sentir saudades, tanto da cidade, como das pessoas que encontramos. E que as saudades também seriam revertidas em vontade de voltar, de poder explorar mais, de me comunicar melhor, de entender melhor o que acontece naquela cidade. Eu posso dizer que amei Santiago, amei também todos os passeios que fizemos nas cidades próximas, principalmente Cajón del Maipo que tanto me fez refletir sobre a vida, mas Santiago ganhou meu coração. Roubou meu coração. Senti que existia algo ali muito interessante. Talvez fossem as pessoas ou a música, a poesia e a arte sempre presentes, ou as paisagens incríveis como plano de fundo, talvez. Mas senti que existe algo ali que parece muito cru e despido de vaidade, algo intrínseco e revolucionário que me conquistou.

Para mim, é sempre difícil dizer adeus. Não tenho palavras para agradecer a companhia, o carinho e a hospitalidade que recebi/recebemos de pessoas tão queridas e que devido à distância, nunca mais encontramos, das pessoas que conhecemos, e especialmente do Seu Guillermo, que se tornou como um segundo pai, um pai extremamente cuidadoso e de coração aventureiro.

Adeus Chile e até breve!

La Flórida

PS. Todas os vídeos foram feitos por mim, as fotos foram tiradas por mim, minha irmã e pelo celular do Seu Guillermo.

Primeira parte aqui: https://medium.com/@anglicayassue/chile-un-pa%C3%ADs-de-temblores-culturales-parte-1-436a0e5e8ac7

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comunicadora social, militante das liberdades emancipadoras, com muitas ideias apaixonadas para mudar o mundo e a si mesma. aqui vc encontra crônicas e emoções.

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Angélica Yassue

comunicadora social, militante das liberdades emancipadoras, com muitas ideias apaixonadas para mudar o mundo e a si mesma. aqui vc encontra crônicas e emoções.