Prosa em dialética: as dores da cidade e a consciência para si
--
Quero que toda vez que a cidade te engolir e você se sentir pequeno frente a prédios gigantes e inacessíveis
Que toda vez que você estiver em coletivo lotado com todos os espaços individuais ocupados
Que toda vez que olhos escorregadios devorarem minissaias enquanto pés descalços são invisíveis
Que toda vez que colarinhos brancos olharem quem lustra seu par de grife de cima para baixo
Que toda vez que o pisar do salto for mais alto que a colher raspando o último grão no prato
Que toda vez que o latifúndio for a cobiça perante a condenação da maioria à mais-valia
Que toda vez que placas pretas tiverem preferência ante vulneráveis corpos que resistem ao asfalto
Que toda vez que a mídia for insensata e em segredo o governo feche acordos que nos matam a cada dia
Que toda vez que um produto causar mais clamor que corpos explorados nas esquinas e fábricas
Que toda vez que a guerra for dissimulada e a fumaça cause a cegueira diante da carne sangrenta
Que toda vez que o veneno escorrer pelas nossas bocas, enquanto as mortes no campo são numéricas
Que toda vez que a lagosta for almoço enquanto a noite petrifica a matéria que não esquenta
Que toda vez que um@ trabalhador@ perder a esperança diante de sua insignificância
Que toda vez que você se sentir impotente, com o coração apertado perante toda essa ânsia
Que toda vez que você sentir que vai enlouquecer e partir para uma alienação sem consciência
…
Você pare, respire e continue andando
E finja que é tudo areia macia, por enquanto
Pegue seu fone e ouça uma canção que dê esperança
Deixe-se conduzir por essa necessária dança
E se as pessoas que passam e encaram incomodar
Sinta como brisa, que bate leve no rosto a refrescar
Como a doce (e falsa) sensação de liberdade
Deixe seus pensamentos de lado por necessidade
Mesmo que o pesar seja excessivo e o ímpeto escasso
E tenha paciência diante da sensação de fracasso
Para não se perder ou adoecer no decorrer da luta
Porque se sou incapaz de tirar de ti essa dor absoluta
Que sejamos capazes de nos fortalecer juntos
E, com os nossos, poder tirar essa dor do mundo
Sem utopia, sem leviandade, sem precipitação
Consciência, formação, disciplina e agitação
Coletividade, amor, empatia e emancipação
E, assim, façamos da nossa casa o início de uma poderosa revolução.
(e vamos tomar os meios de produção)